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sábado, 20 de novembro de 2010

Sou ao Som

SOU AO SOM

Não entendo os sentidos.
Só os flano.
Sem direção.

Sinto-lhes os passos.

Imito seus ritmos
Aos intervalos da ausência.

Trôpego entre harmonias,
Sou de todos os ares.

Não sou ao fim do sopro:
Tropeço no nada ao silêncio.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Era muito a Tarde.

Desde cedo
A tarde pendia

Estendia-se
Meio às pontas
Do tempo.

Firmais fiéis
Sustavam o dia.

Folhas sonhavam:
Rios e vendavais.

As formas jaziam
De uma única essência.

E os momentos penavam
Por horas certas,
Com fim e começo.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

carta de Amor

Carta de amor
"Todas as cartas de amor são ridículas",
Álvaro de Campos



A água de rosas ganhava um odor ácido no ar. Quem entrasse poderia ter acessos de vômito.
Uísque, vinho, sêmen e outros tantos se misturavam pelo quarto.

Sobre a cama de dossel entalhado, e contornado por um tule vermelho, debruça a mulher. Remexe uma caixa à procura de mais uma lembrança. A cada noite como aquela, movimentada, tinha que se livrar de outra. Era um ritual.

“Foram tantos esta noite. Estou arriada.” Falou olhando entre as pernas. “E a cada noite tenho que aceitar: nada mudará”.

Interrompe a fala solitária. Abre a carta e lê como se escutasse quem a escreveu.

Cara princesa de meus futuros dias,


Nessas mal traçadas linhas desta (per )missiva declaro intenções

que superem tão risível exposição. Exposição tão já marcada por seus fac-símiles: modelos à beira do desgaste do lugar-comum.
Perfumadas entre volteios de barrocas ou neoclássicas letras,
onde “ós” e “ésses” não conseguem finalizar seus contornos.

Espero que, entre os pássaros de timbres maviosos que escutas enquanto
lês esta carta de tamanha pureza, lembra-te sempre daquele mais recluso mas,
quando bem atiçado, entrega-se a saliências ( já o provocara como bem recordas, ou não? ). E ao qual inspira atos de liberdade,

por um doce espocar de estrelas, luzes de nossas vindouras noites.
Noites marcadas por presentes que só o nosso futuro pretende rememorar. Lembras quando pulamos a cerca sobre o jardim do agente funerário da cidade?
Lugar em que te fiz uma grinalda de margaridas, roubadas ali.
Ato tresloucado e apaixonado.

Mergulhei por mares nunca dantes navegados
enquanto deslizava por teus cabelos vastíssimos.
Vastidão a mais recatada, por onde ainda ninguém se aventurara.

Empunhado das mais contundentes e tesas intenções
desferi golpes contra o monstro que te fustigavas com seu fogo interminável. Recebias-me, desde então, com uma única flor,
bem cuidada e bem regada por teus sonhos. A cada noite. Única a cada dia.
Em subidas por árvores: trepadeiras frágeis ou vigorosos carvalhos.
Nos esconderijos sob escadas, ou aos olhos da Lua.

Reacenda estas lembranças e esta carta será única. Só minha e tua.

Espero retorno tão evocativo de minha pessoa quanto demonstrei sobre ti
e de outros momentos futuros e saudosos, inspirações tão imaculadas
para aqueles que ainda nos esperam em destino tão longevo e próspero.

Flamejante Cavalheiro.

“Mais uma que vai virar cinzas na lareira quente de madame Cousette”. Rasga-a toda e a deposita picada, sobre um pote no criado-mudo. “Amanhã comprarei roupas e cintas-liga novinhas. Justinhas. Na medida certa. De lasseadas já bastam nós duas, não é querida?”. Gargalha e bate a mão entre as pernas. E ali termina a noite, acariciando o que realmente foi seu destino. Pouco próspero e, com certeza, sem longevidade para o futuro.